quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Os Direitos do Preso


É essencial para falar em direito dos presos indagar porque o Estado está autorizado a prender pessoas, isolando-as da sociedade em presídios, cadeias etc?

O que autoriza o Estado a cumprir pena, privando de liberdade alguns dos seus membros é a necessidade de proteção de determinados bens que são considerados essenciais para a convivência pacífica em sociedade.

Esses bens são chamados de bens jurídicos. É de se imaginar que para que um bem possa autorizar a privação da liberdade, pela prisão, de um membro da sociedade esse bem deve ser muito importante. Não é qualquer coisa que pode justificar tamanho custo humano.

Pois bem, os bens jurídicos que merecem proteção e que se de alguma forma desrespeitados podem ensejar a prisão estão descritos na Constituição Federal (vida, liberdade, privacidade etc). e só podem ser objeto de proteção do direito penal quando existe uma clara necessidade social.

Os bens jurídicos são, portanto, valores constitucionalmente protegidos que podem ser definidos como bens essenciais do ser humano que possibilitam sua plena realização e desenvolvimento em sociedade e que facilitam ou asseguram a participação social livre e igualitária.

O direito penal, por sua vez, diante desses valores descritos na Constituição, tem por função exclusiva intervir apenas quando for necessário para a conservação ou manutenção da convivência pacífica dos cidadãos, para garantir-lhes a liberdade: só se pode punir lesão ao bem jurídico se isso for imprescindível para a convivência em comum, no Estado democrático de direito cabe ao direito penal a proteção dos cidadãos.

É tarefa do direito penal resguardar as condições elementares para a convivência social e a auto-realização do homem em sociedade. Num direito penal que tem por limite os princípios constitucionalmente consagrados, a prisão só pode ocorrer onde houver e necessidade de aplicação de pena para a proteção de bens jurídicos relevantes e do próprio indivíduo.

O direito penal tem a função de assegurar a liberdade de todos os cidadãos, minimização da violência e o arbítrio punitivo e maximização da tutela dos direitos, da liberdade e da segurança dos cidadãos.

No Estado democrático de direito o Estado está a serviço dos cidadãos. Por ter a pessoa como objeto principal de proteção, o Estado de direito é incompatível com qualquer proposta de diminuição de garantias e o direito penal só deve servir para limitar a violência.

No entanto diminuir a violência é fazer prevalecer sobre a prisão a liberdade; sobre a necessidade de cumprir pena as garantias individuais. Daí surgem os direitos do preso no estado democrático de direito, no qual o cumprimento da pena não pode implicar jamais na perda ou minimização dos direitos fundamentais.

É porque não podem ser minimizados que da vigência dos direitos fundamentais deriva a obrigatoriedade de sua proteção pelas autoridades administrativa e judiciária. Daí decorre que já não é mais possível afirmar que, no âmbito da relação penitenciária, haja uma relação especial de sujeição ou que o preso seja visto como alguém sujeito a uma relação especial de poder. O que há é uma pessoa sujeita a meras 'regras especiais' que não atingem a titularidade dos direitos fundamentais. Essas regras especiais implicam em direitos e deveres recíprocos, do preso e da administração e os direitos fundamentais, como direitos inerentes a todos os cidadãos, só podem ser limitados, em razão dessa relação, excepcionalmente, nos casos expressamente previstos em lei, quando a limitação for imprescindível para alcançar um dos fins assegurados pela ordem valorativa da Constituição. Assim, essa relação entre preso e administração só pode ser interpretada com fins garantistas e os direitos fundamentais dos reclusos não podem ser minorados ou abrandados em razão de sua situação jurídica. O preso mantém o direito à divergência, à discordância, ao não acatamento de ordem que afete seus direitos individuais não atingidos pela sentença, mantém, enfim, sua cidadania.

A administração penitenciária tem o dever de respeitar os direitos fundamentais dos reclusos de forma a assegurar o exercício de todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei e a esse dever corresponde a obrigação do preso de respeitar as normas do regimento interno reguladoras da vida do estabelecimento. No entanto, anote-se, intolerável é qualquer forma de arbitrariedade por parte da autoridade administrativa e as finalidades de não-dessocialização e de harmônica integração social do preso, devem guiar as medidas que se adotem durante o cumprimento da pena.

Por fim e em última instância à autoridade judicial cabe garantir os direitos dos presos e faze-los cumprir pelo sistema penal e penitenciário Ao poder judiciário cabe fazer o controle externo dos atos da administração, faz parte de seu dever de zelar pelos direitos individuais do preso e pelo correto cumprimento da pena.

Cumpre ao direito penal controlar a violência do poder, sua intolerância, irracionalidade e autoritarismo. No Estado democrático de direito, o direito penal não convive com respostas igualmente violentas, pois, como já referido, o que o legitima é a vinculação ao estrito respeito aos princípios consagrados formalmente na Constituição.

Ao preso são assegurados todos os direitos não afetados pela sentença penal condenatória e seus direitos só podem ser limitados excepcionalmente nos casos expressamente previstos em lei. E a lei de execução penal prevê expressamente as ocasiões em que os direitos podem sofrer limitação dentro do presídio

Os presos têm, portanto, assegurado tanto pela Constituição Federal, quanto pela Lei de Execução Penal seu direito de à vida, à dignidade, à liberdade, à privacidade etc.

O princípio da dignidade da pessoa humana assegura e determina os contornos de todos os demais direitos fundamentais. Quer significar que a dignidade deve ser preservada e permanecer inalterada em qualquer situação em que a pessoa se encontre. A prisão deve dar-se em condições que assegurem o respeito à dignidade.

No que tange aos princípios e garantias constitucionais podemos dizer que o princípio da legalidade assegura que os presos só podem ter restrições de direitos quando previamente previsto em lei. Os condenados mantém os direitos não atingidos pela sentença penal condenatória. A legalidade assegura ao sentenciado a liberdade – no âmbito da existência e não atingida pela sentença – de pensamento, união familiar, privacidade etc.

O princípio da igualdade garante igualdade aos presos no que diz respeito aos direitos fundamentais. Garante respeito às diferenças e determina que todos devem ser feitos tão iguais quanto possível quando a desigualdade implicar em prejuízo de alguns. A igualdade também assegura o direito de ser diferente, de não se submeter a tratamento de modificação de personalidade e proíbe discriminação de tratamento, dentro ou fora do presídio, em razão de especial condição seja de ordem social, religiosa, racial, político-ideológica

O princípio da individualização da pena assegura que a pena seja aplicada àquela pessoa individualmente considerada, de forma a possibilitar o livre desenvolvimento da sua personalidade individual e que deve haver proporção entre ação e reação, entre gravidade do crime e gravidade da pena e que a pena deve ser cumprida dentro do marco constitucional de respeito à dignidade do sentenciado e não em função dos anseios sociais de punição.

Para os presos o princípio do devido processo legal garante que durante o cumprimento da pena seus pedidos sejam apreciados e julgados por juiz natural e imparcial, que seja garantido o contraditório com produção de provas, a ampla defesa com assistência técnica indispensável, que as decisões sejam fundamentadas para proporcionar análise por outras instâncias, o direito a um processo sem dilações indevidas, eqüitativo, com igualdade de tratamento e de armas.

A humanidade da pena determina que o homem não pode ser tratado como meio mas como fim, como pessoa, o que impõe limitação a quantidade e à qualidade da pena e, consequentemente, o respeito à vida e a proibição de penas cruéis ou degradantes, incluído o rigor desnecessário e as privações indevidas impostas aos condenados. Aos condenados à pena privativa de liberdade deverão ser propiciadas as condições para uma existência digna, velando-se por sua vida, saúde e integridade física e moral.

A humanidade da pena assegura ainda o direito de cumprir pena perto dos familiares, à intimidade, à privacidade, à liberdade de expressão e ao sigilo da correspondência.

Na Lei de Execução Penal (LEP) são, principalmente, os artigos 41, 42 e 43 que descrevem, obviamente sem pretensões esgotar o assunto, direitos dos presos.

Inicia-se com a garantia de respeito devido por todas as autoridades à integridade física dos condenados e presos provisórios (art. 40 da LEP).

Segue o art. 41 da LEP estabelecendo desde direitos elementares que devem ser assegurados aos que estão sob a responsabilidade do Estado, como direito à alimentação, vestuário, educação, instalações higiênicas, assistência médica, farmacêutica e odontológica; como direitos que tem por finalidade tornar a vida no cárcere tão igual quanto possível à vida em liberdade. Entre estes direitos estão a continuidade do exercício das atividades profissionais, artísticas e desportivas anteriores à prisão, desde que compatível; assistência social e religiosa; trabalho remunerado e previdência social, proporcionalidade entre o tempo de trabalho, de descanso e de recreação; visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados, contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura, e de outros meios de informação.

Ainda, no mesmo artigo estão descritos direitos que visam assegurar a defesa dos interesses do preso em razão da prisão. Entre eles podemos citar a proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; assistência jurídica; entrevista pessoal e reservada com o advogado; chamamento nominal; igualdade de tratamento; audiência especial com o diretor do estabelecimento; representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito.

Devem ainda ser destacados o direito do maior de sessenta anos e da mulher de ficarem em prisões adequadas a sua condição pessoal; das mulheres de ficarem presas em estabelecimentos que contem com berçário para que possam amamentar seus filhos; de todos os condenados de cumprirem pena em cela individual, com área mínima de seis metros quadrados e que contenha dormitório, aparelho sanitário e lavatório, com condições de salubridade adequadas á existência humana.

Importante ressaltar, mais uma vez, com o art. 3º da LEP, que ao condenado estão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.

BIBLIOGRAFIA
BARROS, Carmen Silvia de Moraes. A Individualização da pena na execução penal
São Paulo, Editora Revista do Tribunais, 2001.
FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón: teoría del garantismo penal. 3. ed. Trad. Perfecto Andrés Ibañés, Alfonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradilhas Basoco, Rocío Cantarero Bandrés. Madrid: Trotta, 1998.
SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María?. Aproximación al derecho penal contemporáneo. Barcelona: Bosch, 1992.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. En busca de las penas perdidas: deslegitimación y dogmática jurídico-penal. 2. ed. Santa Fe de Bogotá: Temis, 1993.
. La culpabilidad en el siglo XXI. Revista Debate Penal, Buenos Aires: Editorial San Marcos, v. 4-6, n. 10-12, p. 25-45, 1993.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
Carmen Silvia de Moraes Barros
Defensora Pública do Estado de São Paulo
Especialista em direito do estado e mestre em direito penal pela faculdade de direito da universidade de São Paulo
Fonte: http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-index.php?page=Direitos%20do%20preso

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Assédio Moral no Ambiente de Trabalho e a Política Empresarial de Metas

Foi lançado nesta terça-feira, 25/09/12, no auditório da Unifenas em Belo Horizonte, o livro "Assédio Moral no Ambiente de Trabalho e a Política Empresarial de Metas", pela editora RTM, do Advogado Rafael Morais Carvalho Pinto, Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/MG, Especialista em Direito de Empresa pela Universidade Gama Filho/RJ, Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos/BH, Advogado Trabalhista e Professor Universitário da Faculdade de Direito Unifenas/BH.

O assédio moral praticado no ambiente de trabalho ganhou nos últimos anos uma atenção especial pelos operadores do direito, em razão dos efeitos negativos que esse fenômeno tem causado na saúde dos trabalhadores.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhecem a gravidade das consequências das práticas de assédio moral e, com grande preocupação, fazem um perigoso alerta, no sentido de que a violência moral nas relações de trabalho tende a crescer ainda mais no atual mundo globalizado e competitivo, sendo que as doenças psíquicas poderão nas próximas duas décadas estar entre as grandes causas de incapacidade laboral, causando, inclusive, fortes impactos nos sistemas previdenciários mundiais.

Nesse contexto, as metas aparecem intimamente ligadas ao fenômeno do assédio moral. Quanto mais se busca o lucro de forma desenfreada, sem a preocupação com o trabalhador, mais propício se torna o ambiente laboral para o aparecimento da prática perversa do assédio.

Assim, este trabalho vem colaborar para o amadurecimento da discussão acerca dos limites na imposição das metas de produção, que transita em uma linha tênue, entre o que pode ser considerado saudável para o objetivo do lucro e o que pode ser fator potencializador do assédio moral.

Acompanhe um trecho do lançamento do livro:


terça-feira, 25 de setembro de 2012

Policia Civil e Ministério Público brigam sobre o direito de Investigar


As duas instituições voltaram a se estranhar na quinta-feira [20/09] depois de oito suspeitos, presos por tráfico de drogas em uma operação do MP, serem liberados pela Polícia Civil

Enquanto a lei segue inalterada no Congresso e o tema não é pacificado na Justiça, a Polícia Civil e o Ministério Público (MP) continuam em guerra pelo direito de investigar crimes no Rio Grande do Sul.

As relações entre as duas instituições voltaram a azedar na quinta-feira depois de oito suspeitos, presos por tráfico de drogas em uma operação do MP em parceria com a Brigada Militar, serem liberados na 3ª Delegacia de Pronto Atendimento da Polícia Civil, na Capital.

Embora a delegada Ana Luiza Caruso tenha justificado a medida sob o argumento de ilegalidades na captura dos suspeitos, afirmando que a BM não poderia cumprir mandados de busca e monitorar conversas telefônicas, para o MP o motivo da soltura faz parte de uma postura bem mais abrangente: um ranço da Polícia Civil pelo fato de o MP ter realizado a investigação.

Independentemente de quem tem razão, o assunto é polêmico e gera debates pelo país. Na Câmara dos Deputados, uma comissão especial discute a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 37, que dá poderes de investigação exclusivos para as polícias Civil e Federal. E, no Supremo Tribunal Federal (STF), tramitam ao menos oito ações diretas de inconstitucionalidade sobre o tema.

– A Constituição não diz expressamente que o MP pode investigar, mas deu poderes para denunciar crimes, e existem duas decisões da 2ª Turma do STF entendendo que, se o MP tem poderes para acusação, precisa dos meios para isso. Assim, implicitamente, poderia investigar – diz o advogado Otávio Piva, professor de Direito Constitucional das escolas superiores da Magistratura, da Magistratura Federal e a do Ministério Público.

Segundo Piva, a Corte ainda não se posicionou em definitivo e, enquanto o Plenário do STF não julgar, seguirá a confusão. Particularmente, Piva entende que o MP está certo:

– É preciso abrir mão dessa briga de beleza para o bem da sociedade.

Para especialista, divergências trazem prejuízos à sociedade

Alexandre Wunderlich, também advogado e professor de Direito Penal e Constitucional na PUCRS, é contra o MP investigar, mas admite que essa posição tem sido derrotada no STF e no Tribunal de Justiça do Estado.

Mesmo avesso ao poder investigativo do MP, Wunderlich afirma que, quando vai a campo, o MP faz um trabalho mais qualificado do que o dos policiais.

No MP, os controles são mais rígidos, os advogados se sentem mais seguros, não ficam tão vulneráveis, sem negativas de acesso aos autos. A estrutura do MP é mais organizada, talvez porque seleciona o que vai investigar, enquanto a polícia tem de atuar em tudo – afirma o criminalista.

Conforme o sociólogo Juan Mario Fandino, do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a briga só traz prejuízos:

– Quando isso acontece, a sociedade se sente menos protegida e passa a confiar menos nas instituições de segurança.

As atribuições

BRIGADA MILITAR

Tem função de polícia ostensiva e preventiva, atuando nas ruas para evitar crimes e preservação da ordem pública. Não tem poder de investigação nem de realizar escutas telefônicas (a não ser quando se trata de crimes cometidos por PMs). Ao capturar um suspeito, a BM conduz à Polícia Civil para elaborar o inquérito policial.

POLÍCIA CIVIL

Apura infrações penais, exceto as militares e as de competência da União (atribuição da Polícia Federal). A partir da captura de um suspeito ou de registros de ocorrências, investiga crimes, elabora inquérito apontando suspeitos e o remete para apreciação do Ministério Público.

MINISTÉRIO PÚBLICO

Recebe o inquérito policial, analisa as provas e, dependendo do conteúdo, denuncia o suspeito à Justiça, manda arquivar o caso por falta de provas ou devolve o inquérito à Polícia Civil, pedindo novas investigações. É comum promotores darem sequências nas investigações para melhorar a qualidade do inquérito ou, por iniciativa própria, abrir inquéritos, independentemente da polícia, pois há entendimentos no STF de que o MP tem poder para isso.

O que pensam

Coronel Sérgio Roberto de Abreu, comandante-geral da Brigada Militar

Não vejo ilegalidade da BM em cumprir mandados, pois há um termo de cooperação de combate à criminalidade firmado pelo governador do qual fazem parte a BM, a Polícia Civil e o MP. A BM não faz investigação criminal, nem escutas, a não ser quando faz parte de uma estrutura conveniada como a existente.

Ranolfo Vieira Junior, chefe da Polícia Civil

Não tenho conhecimento do caso e por isso não posso avaliar se a decisão dela (delegada que liberou presos) foi certa ou errada. O promotor já me ligou antes, mas eu disse que não posso obrigar um delegado a lavrar ou não flagrante, como não posso ligar para ele pedindo para denunciar ou não alguém.

Marcelo Dornelles, subprocurador-geral para Assuntos Institucionais do MP

Vejo esse assunto com muita preocupação. Isso tem acontecido de forma reiterada. Duas vezes eu liguei direto para o chefe de Polícia e isso nunca se resolve. Vou procurar a Secretaria da Segurança Pública. O prejuízo é da sociedade. Está muito clara a postura de ser contra o trabalho do Ministério Público ajudado pela Brigada Militar. É uma disputa de classe pelo poder de investigar.

Discórdia entre autoridades

Casos recentes que colocaram em lados opostos o Ministério Público e a Polícia Civil no Rio Grande do Sul:

PORTO ALEGRE

— Em fevereiro de 2010, o então secretário municipal de Saúde, Eliseu Santos, é assassinado a tiro no bairro Floresta (foto ao lado). A Polícia Civil concluiu que o caso foi uma tentativa de assalto, mas dois promotores comandaram uma investigação à parte e apontaram homicídio premeditado, encomendado por pessoas prejudicadas em processo licitatório envolvendo a Secretaria Municipal de Saúde.

IJUÍ

— O Tribunal de Justiça anulou processo criminal contra uma suspeita de tráfico. O desembargador Nereu Giacomolli entendeu que foi ilegal o pedido do MP para que a BM cumprisse mandado de busca e apreensão em uma residência em novembro de 2011. Giacomolli mandou liberar a suspeita por entender que o mandado só poderia ser cumprido pela Polícia Civil. Policiais civis cumpriram novo mandado, e a mulher voltou à prisão.

GRAVATAÍ

— Em dezembro de 2011, a BM prendeu sete suspeitos de tráfico. Eles foram detidos durante o cumprimento de 32 mandados de busca e apreensão, expedidos pela Justiça, a pedido do MP. Considerando que houve abuso de PMs que conduziram os presos até um sítio para identificação antes de levá-los à delegacia, o delegado plantonista Júlio Fernandes Neto decidiu não autuá-los em flagrante. Os suspeitos foram soltos.

ZERO HORA
Fonte: http://www.asstbm.com.br/policia-civil-e-ministerio-publico-brigam-sobre-direito-de-investigar-crimes-no-estado/

Os dramas das vítimas de assédio moral são relatados no programa Repórter Justiça


O assédio moral é definido como conduta abusiva de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo de forma repetitiva e prolongada, com o objetivo de transtornar a vítima e levando à perda da autoestima, ao cometimento de erros e, invariavelmente, à perda da confiança em sua própria capacidade produtiva.

Humilhação pessoal. Constrangimento social. Dor moral. Sensação de impotência e exclusão do ambiente de trabalho. Tristeza e depressão. Esses são alguns sentimentos de quem sofre assédio moral, o assunto do "Repórter Justiça" desta semana.

Você vai conhecer histórias como a de Estênio. O economista foi vítima de assédio e durante muito tempo, não dividiu o constrangimento nem mesmo com os familiares. “Eu fiquei indignado, minha família ficou indignada, me cobraram uma providência. Eu passei muito tempo calado porque eu precisava do meu emprego”, lembra.

Além dos relatos, durante o programa da TV Justiça, você vai ver a análise de advogados trabalhistas, ministros do Tribunal Superior do Trabalho e psicólogos.

Você conhecerá, também, qual a categoria profissional mais atingida pelo problema e o relato amargurado da história de uma vítima de assédio, que por muito pouco não teve um fim trágico.

O "Repórter Justiça" vai ao ar toda sexta-feira, às 21h30, e pode ser visto durante a semana nos horários alternativos.

O programa da TV Justiça também é disponibilizado no YouTube (www.youtube.com/stf ).
Horários alternativos: sábado – 18h / segunda-feira – 13h30 / quarta-feira – 18h

Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=118617

Execução Penal e Psicologia Jurídica

(...) A Lei 7210 de 17 de junho de 1984 (Lei de Execução Penal) é, sem dúvida, uma das normas de maior grau de excelência do ordenamento jurídico brasileiro. Mesmo tendo sido editada em meados da década de 80 do século XX, conseqüentemente anteriormente à própria Constituição Federal de 1988, trouxe inovações esplendidas com uma atualidade indiscutível. Contudo, é bem verdade, que o sistema prisional nacional ainda não conseguiu adequar-se a seus elementos básicos, e, o que hoje se contempla é um grande contraste entre o que descreve a citada lei e o que se observa na prática.

A Lei de Execução Penal (LEP) tem como foco em seu inciso 23 a “ressocialização das pessoas condenadas e reconhece um respeito saudável dos direitos humanos dos presos e contém várias provisões ordenando tratamento individualizado, protegendo os direitos substantivos e processuais dos pesos e garantindo assistência médica, jurídica educacional, social, religiosa e material”. Neste contexto encaixa-se a assistência psicológica aos presos, de fundamental importância para além de vários outros fatores a superação de sua realidade. A psicologia defronta-se com as diferentes formas de sofrimento que fere a estrutura individual e/ou coletiva e a própria dinâmica psíquica do sujeito e dos membros familiares. Na prisão, mecanismos como negação da realidade, cisão e onipotência ocupam o imaginário. São fantasias inconscientes e que sofrem influências da sociedade na qual o sujeito está inserido, numa clara interação com a realidade externa.

O QUE É EXECUÇÃO PENAL

A Lei de Execução penal é uma codificação a respeito das normas de sentenciar penas e medidas privativas de liberdade. Segundo Giovanni Leone “a função da execução penal deita raízes no que diz respeito à vinculação da sanção e do direito subjetivo estatal de castigar.”

A finalidade das penas privativas de liberdade, quando aplicadas, segundo Everardo da Cunha Luna “é ressocializar, recuperar, reeducar, ou educar o condenado, tendo uma finalidade educativa que é de natureza jurídica.” È preciso nunca esquecer que o direito, o processo e a execução penal constituem apenas um meio para a reintegração social, indispensável, mas nem por isso o de maior alcance, já que a melhor defesa da sociedade se obtém pela política social di Estado e pela ajuda pessoal.

“O sentido imanente da reinserção social conforme o estabelecido na lei de execução compreende a assistência e ajuda na obtenção dos meios capazes de permitir o retorno do apenado e do internado ao meio social em condições favoráveis para sua integração, não se confundindo como qualquer sistema de tratamento que procure impor um determinado número e hierarquia de valores em contraste com os direitos da personalidade do condenado” (FABRINI, Júlio 2000 p.26)

O Art. 1º da LEP prevê que: A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

PRINCIPAIS NORMAS DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL

Como atividade complexa que é, em todos os sentidos, a execução penal pressupõe um conjunto de deveres e direitos envolvendo o Estado e o condenado que deve submeter-se a um conjunto de normas de execução da pena. Referidas normas, traduzidas em deveres, representam, na verdade, um código de postura do condenado perante a Administração e o Estado, pressupondo formação ético-social muitas vezes não condizente com a própria realidade do preso.

Paralelamente aos deveres há um rol de direitos do preso. A execução penal, no Estado Democrático e de Direito, deve observar estritamente os limites da lei e do necessário ao cumprimento da pena e da medida de segurança. Tudo o que excede aos limites contraria direitos. Nos termos do art. 41 da Lei de Execução Penal, são direitos do preso: I - alimentação suficiente e vestuário; II - atribuição de trabalho e sua remuneração; III - previdência social; IV - constituição de pecúlio; V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado; X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI - chamamento nominal; XII - igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV - representação e petição a qualquer autoridade em defesa de direito; XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.

O ENCARCERAMENTO E OS DESAFIOS DA PSICOLOGIA

Precisamos pensar a sociedade, cúmplice da violência que não cumpre a função organizadora no que tange as questões da distribuição de renda e da educação, se isenta da responsabilidade psicossocial, simplesmente assiste silenciosamente crescer o número da violência e da delinqüência. A violência está em todos os lugares: nas ruas, nos bares nas festas e não apenas dentro das prisões. A prisão sem dúvida adoece e traz o estigma mesmo o cidadão estando em liberdade, após cumprir a sua pena. Estes sujeitos são vistos pela sociedade como inadequados, desvalidos delinqüentes e marginais. As punições são coletivadas, pois se há um desvio de conduta perante as leis, todas são punidas. Os cidadãos presos são estigmatizados, tratados como uma “coisa”, logo fora da prisão acabam tratando os demais também como “coisas”, desvalorizando e banalizando o outro, sem que se dê conta de que está menosprezando primeiramente a si mesmo.

Porém o crime é um fenômeno decorrente da cultura e faz parte da história da humanidade. O criminoso é uma produção social e as razões que justificam tais crimes são as mais variadas: frente ao diferente, vaidade, disputa por territórios, vingança entre outros. A palavra não mais media as relações humanas e o cidadão parte para criação.

REABILITAÇÃO

A sociedade entende a reabilitação como uma forma de reinserção social. Porém, para o social retorno do cidadão preso não interessa e estes cidadãos sabem disso, por isso a grande dificuldade de inclusão, principalmente no mercado de trabalho. O crime segrega. Considerados como resquícios de sujeitos depositados num quarto de despejo e marcados para sempre, marca-fruto da condição de encarcerados- irá persegui-los por toda a vida.

A reabilitação é uma das medidas que visa treinamento é tratamento desses infratores “uma forma de reparação que a comunidade civilizada tem o direito de exigir (apud, PLAYFAIR; SINGTON, 1969, p.30), como esses infratores não fossem civilizados. Mais uma vez a sociedade se vê no direito e no dever moral de tornar “bons” seus membros “maus”. Pagar mal com o mal nunca adiantou. Repetir um erro é substituir um erro por outro ainda mais cruel. Nas prisões exclui-se qualquer valorização da vida humana de tal forma que uma vez dentro dos presídios, acaba-se o livre-arbítrio e inicia-se castigos corporais, morais e psicológicos. Neste contexto, estes cidadãos devem aprender a conviver com condições miseráveis de existência, em que são forçados a viver numa atmosfera de opressão vinte e quatro horas por dia, irritação constante, inveja, raiva, ódio, desespero, vícios, doenças e falta de esperança uma vez condenado, acabam cometendo outros crimes dentro das prisões.

Considerados como a escória da humanidade, o único consolo é a boa conduta que os levarão aos braços da mesma sociedade desinteressada e mesmo sendo cúmplice desse individuo que viola as leis, esta sociedade fabrica ladrões para puni-los depois, numa espécie de perseguição organizada. Mais uma vez se fecha um círculo vicioso em que uma minoria sofre a punição, de forma severa e cruel, sendo que “a crueldade mesmo é um fenômeno social que apenas pode ser entendida em termos das relações sociais dominantes num dado período” (apud RUSHE; KIRCHEIMER, 1999, p.38). Desigualdade, discriminação e preconceito de cor e raça mascaram ações, reforçando a díade domindado-dominante.

O crime produz e é produzido, ou seja, se atualiza no cotidiano social, mas isso não quer dizer que qualquer cidadão irá cometer um crime. O crime é fruto de um contexto este irá nos fornecer o marco referencial da inserção do homem e/ou da mulher no mundo criminal. Este sujeito – violador da lei – é visto como uma ameaça a própria existência da ordem social, do “status quo”. Sendo que muitas vezes o que os leva aos atos puníveis pela lei é a miséria, a fome, conseqüência da falta de uma igualitária distribuição de renda. Mas deve-se perguntar “o que são estas leis para as quais eu nasci para respeitar, que fazem a diferença entre eu e um homem rico ser tão grande? (apud RUSHE; KIRCHEIMER, 1999, p.104).”

É essa a realidade de impossibilidades que presenciamos desde as primeiras prisões e sabe-se que a prisão é um castigo, um meio de punição, em que se retribui um castigo com outro castigo, ainda mais severo. O cárcere e a condenação representam a privação da liberdade e este cidadão além de sofrer, se vê confrontado com a superlotação nas cadeias, a não revisão das penas e as rebeliões.

LEI E A PRISÃO

Nesse mundo complexo e de incertezas o que agrava ainda mais o sistema prisional é a falta de infra-estrutura física adequada, para garantir o cumprimento da lei e os muitos problemas de superlotação nas cadeias brasileiras, reforçando um sistema carcerário desumano. O sistema prisional é um lugar complicado que requer muito pensar: de um lado o criminoso que se vê abandonado pelo Estado, procura o seu lugar num “bando” e assim institui as suas próprias leis, sendo que as leis do Estado não são aplicadas a ele; o cárcere como sendo o lugar do esvaziamento e da apologia ao crime; do outro, o psicólogo como pensador desse conflito, individual e/ou coletivo; e toda a equipe que trabalha no sistema prisional.

Acreditamos que o psicólogo deverá atuar como agente provocador de mudanças, intervindo no foco do problema visando a saúde mental. Para isso deve fazer uma interface com a sociologia, a antropologia e com a criminalidade crítica, pois segundo FRANÇA, não se busca a explicação do comportamento criminoso, aliás, o individuo não é visto como desviante, entra em cena a análise sobre a sociedade e o que ela tem a ver com o individuo em questão. E que se deve buscar a compreensão da criminalidade por meio do estudo da interação entre individuo crimonoso-sociedade.

São muitas as medidas a serem tomadas por todas as esferas da sociedade. Apesar de o crime ser um fenômeno social, é apenas um recorte de uma realidade vivenciada por um cidadão. Logo um ato em si não é revelador da verdade sobre ele. É necessário um trabalho coerente e ético, que vise o todo do cidadão e o psicólogo deverá ser o profissional que atue diretamente na doença mental.

Enfim, a sociedade é duplamente penalizada, pouco se envolve para atenuar a quantidade de problemas que se avolumam no sistema carcerário e a prisão corrompe ao invés de curar, há uma contaminação mútua, uma corrupção moral e coletiva. O que mais uma vez demonstra a urgência da humanização do sistema prisional e sua completa extinção. Precisamos olhar para o outro sem julgá-lo e sem buscar culpados. Precisamos refletir e agir. Devemos ampliar os horizontes e lutar para que os direitos humanos sejam respeitados a qualquer custo.

O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO E A PSICOLOGIA

No último recenseamento, feito por encomenda do Ministério da Justiça, com o intuito de fazer um “raio-x” da população carcerária brasileira, demonstrou a mesma coisa com escala sensivelmente elevada, a crise econômica vem cada vez ilustrando a criminalidade e a marginalização social. O perfil do detento brasileiro indica que ele é, em sua maioria, do sexo masculino, pobre, branco, tem baixa escolaridade, e geralmente cometeu crime contra o patrimônio: furto ou roubo, e que sendo condenado a regime fechado ele reincide em 45% dos casos. O homicídio é o segundo crime mais cometido, perdendo apenas para o delito do roubo, observava-se que o homicida era aquele criminoso que cometia o crime, geralmente, sob forte emoção ou pressão psicológica, mas nota-se cada vez mais a prática deste crime por motivos fúteis. Os estudiosos garantem que esta violência gratuita é acarretada, mormente pela questão econômica. Estamos diante de uma situação que precisa ser revista urgentemente! Não há o que se contestar não é só o Sistema Prisional que necessita de uma reforma, mas toda uma estrutura social dominante, ocultante, que procura mascarar uma situação desviando o cerne da questão para a discussão de assuntos fúteis como quem casou ou deixou de casar, quem traiu ou deixou de trair, no mundo das estrelas televisivas. A sociedade tem que refletir sobre a questão da criminalidade e aceitá-la como sendo ela a genitora de tal situação. Tem que haver mais exemplos como o da cidade de Itaúna/MG, que diante da rebelião que destruiu a cadeia pública do município, através do Juiz e do Promotor sensibilizou toda a população no sentido de que a execução é antes de tudo responsabilidade de cada cidadão. Com o próprio povo da cidade foi construídas a atual cadeia pública, formados agentes penitenciários, patronatos etc. Ou seja, a própria cidade assumiu seu detento como fruto dela própria e se colocou a disposição para recuperá-lo. Isso é preciso na sociedade como um todo.

A psicologia tem feito um esforço sobre-humano para amenizar a situação, baseada nas idéias pioneiras de Feuerbach e Romagnosi, trata do diagnóstico e prognóstico criminais. Ocupa-se com o estudo das condições psicológicas do homem na formação do ato criminoso, do dolo e da culpa, da periculosidade e até do problema objetivo da aplicação da pena e da medida de segurança. Tal estudo torna-se imprescindível na prevenção do crime e na disciplina dos institutos da liberdade condicional, da prisão aberta, das penas alternativas e outros. Divide-se em Psicologia individual, criada por Adler, com base na psicanálise criminal (Freud, Adler, Jung), em que se estuda o delinqüente isoladamente no sentido da reconstrução dinâmica do delito, considerado algumas vezes como resultado do conflito psíquico; Psicologia coletiva, que tem por finalidade o estudo da criminalidade das multidões em especial; e Psicologia Forense (ou judiciária), que se ocupa do estudo dos participantes do processo judicial (réu, testemunhas, juiz, advogado, vítima etc.)

Dentro do presídio a psicologia trabalha com etapas (basicamente):

1. Entrevista inicial Abordagem feita tanto pelo serviço de psicologia quanto pelo serviço social;    essa entrevista é realizada em média 05 dias após o ingresso do indivíduo no Presídio, colhem-se dados de identificação, saúde, dinâmica familiar, envolvimento com drogas, experiências com o trabalho. Realizam-se orientações no sentido de informar-lhe qual o funcionamento do Estabelecimento, seus direitos, as regras, quais os serviços oferecidos, as formas de contato com os outros serviços,   visitas familiares. Abre-se um prontuário. 

2. Entrevista de orientação: É o nome dado a entrevista de acompanhamento do interno durante sua estada no Presídio, é um procedimento também feito pelo serviço social, o recluso solicita a entrevista através de um memorando (bilhete), que encaminha a um dos serviços, via de regra busca orientação quanto a sua saúde, sua família, sua situação jurídica, dificuldades de convívio, dificuldades de ordem pessoal. O quando  a solicitação não é da competência do serviço, encaminhamos ao setor adequado. É nessa entrevista, quando um vínculo de confiança se estabelece, que se propõem a orientação psicológica, quando há a predisposição do sujeito.

3. Orientação Psicológica: este atendimento que tem um caráter terapêutico mais especifico, vai atender as solicitações do sujeito, nos seus aspectos mais individuais, quando ele se dispõe a tentar compreender junto com o psicólogo, a sua subjetividade, a sua singularidade. Este serviço também é oferecido em casos de soro positividade para o HIV, em sintomas de síndrome de abstinência, na fase que chamamos de saturação, que se referem àquelas pessoas que têm diversas passagens pelo sistema, e se dispõem a refletir sobre porque isso acontece, e aqueles que estão prestes a sair e se angustiam com a expectativa e com o medo do retorno.

4. Grupos de Convivência: com objetivo de promover a interação dos sujeitos, bem como estabelecer relações que possibilitem a reflexão sobre aspectos referentes à dignidade, auto-estima, respeito pôr si e pelo outro, cidadania, participação política, favorecendo a vida em comunidade.

5. Atendimento familiar: atividade desenvolvida através de encaminhamentos do serviço social, com objetivo de manutenção do vínculo familiar.

O sistema punitivo necessita de uma reorganização. Tem que se mudar os métodos arcaicos de tentativa de ressocialização, as penas alternativas têm que sair da idéia para prática, o corpo penal tem de fazer uma reciclagem, a realidade fática que se nos apresenta é diversa da pretendida na Lei Maior Brasileira (Constituição) e pela Legislação Penitenciária. A lei assegura os direitos do preso, mas tais dispositivos legais são esquecidos, visto que o tratamento dispensado aos detentos é precário e o respeito à dignidade humana, infelizmente, são deixados em segundo ou quiçá, último plano. Deve-se tirar o recluso da ociosidade, reeducá-lo, formando a pessoa humana, dando-lhe uma vocação, para reinserí-lo na sociedade. Este tratamento deve vir incumbido de medidas sociológicas, penais, educativas, psicológicas e métodos científicos, de forma integrada numa ação junto ao delinqüente, visando modelar a sua personalidade para a sua reinserção social e para prevenir a reincidência.

BIBLIOGRAFIA

Psicologia Jurídica. Disponível em: http://www.psicologia.com.pt/artigos/textos/A0304.pdf 
Sistema Prisional Brasileiro. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/federal/ufrn/josealeixonmoreiradefreitas/sistemaprisional.htm
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal. 9.ed. São Paulo: Atlas 2000.

FAPAL –FACULDADE DE PALMAS
EXECUÇÃO PENAL E PSICOLOGIA JURÍDICA
Ana Paula Magalhães
Elielma
Lahís Geralda Almeida
Pamella Cristhina
Veruska
Yorrana Ribeiro
EXECUÇÃO PENAL E PSICOLOGIA JURÍDICA
Trabalho apresentado ao curso de Direito (DR1A57) da Faculdade de Palmas-FAPAL, para a disciplina de Psicologia Jurídica.
Orientadora: Prof. Marluce Oliveira.
Palmas
2009
Fonte: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAscMAJ/psicologia-juridica

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

ONG aponta problemas na garantia dos direitos humanos no Brasil


Em nota divulgada nesta sexta-feira, a organização não-governamental Justiça Global apontou problemas na garantia de direitos humanos em relação à remoção de famílias em áreas de grandes obras, à segurança pública, ao sistema prisional e no acatamento de recomendações feitas pelo Vaticano referentes ao conceito de família.
O Brasil recebeu 170 recomendações de 78 delegações estrangeiras do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. A representante brasileira no órgão, embaixadora Maria Nazareth Farani Azevêdo, anunciou ontem (20) que o país acatou 159 recomendações, conforme antecipado pela Agência Brasil.
De acordo com a Justiça Global, o Estado brasileiro "tem ignorado sistematicamente o direito à consulta prévia dos povos tradicionais". Esse procedimento é estabelecido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. A posição do Brasil quanto às oitivas de populações tradicionais, de acordo com a avaliação da ONG, vem ocorrendo em relação às grandes obras. No rol dessas obras, a organização destaca os empreendimentos da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro, além da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.
"O Canadá manifestou preocupação com remoções forçadas. Segundo a delegação canadense, os megaeventos esportivos não podem implicar numa violação de direitos das comunidades, sobretudo as mais pobres e solicitou que sejam evitados ao máximo os despejos e deslocamentos forçados. Apesar de o Brasil ter aceitado essa recomendação de forma integral, as remoções em nome dos megaeventos têm acontecido de forma acelerada. No Rio de Janeiro, por exemplo, 1.860 famílias já foram removidas e outras 5.325 estão ameaçadas", diz nota da entidade, que defende os direitos humanos no cenário internacional.
A questão da segurança pública esbarra na recomendação feita pela Noruega de "abolir o sistema separado da Política Militar". Essas propostas foram totalmente rejeitadas pelo Brasil, que alegou entraves constitucionais. "A resposta brasileira, porém, falhou em perceber a intenção da recomendação. A argumentação de que a Constituição impediria a mudança não procede", defende a nota.
"A definição das funções das polícias na Constituição é passível de mudança através de emenda constitucional, sendo que já tramitam propostas nesse sentido no Congresso Nacional. Esse é um ponto que faz parte da pauta dos movimentos sociais, organizações da sociedade e acadêmicos há anos. O governo brasileiro utiliza o texto constitucional de forma no mínimo passível de crítica para rechaçar uma recomendação legítima que aponta para um problema crescente na sociedade brasileira, que é a militarização da segurança", argumenta a Justiça Global.
Em outro ponto, a organização menciona a falta de resposta à recomendação para implementar o Mecanismo Nacional para a Prevenção e Combate à Tortura. Na resposta à ONU, o Brasil alegou que já está debatendo a implantação. "Ressaltamos que a proposta encaminhada pelo governo brasileiro ao Congresso Nacional não atende aos requisitos de independência previstos no Protocolo Facultativo da Convenção Contra a Tortura da ONU e precisa ser alterada para cumprir sua função e garantir a independência necessária", alegou a instituição.
A Justiça Global reconheceu avanço em relação à necessidade de se destinar recursos e de institucionalizar a proteção mais adequada a defensores de direitos humanos que estão sob ameaça.
O Ministério das Relações Exteriores informou, por meio da assessoria de imprensa, que não irá se pronunciar sobre a posição da ONG. De acordo com o Itamaraty, o governo expressou a opinião do Estado brasileiro nesse caso por meio da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Direito Penal do Equilíbrio

A teoria do Direito Penal do Equilíbrio traz a idéia de somente ser erigido quando estritamente necessário, ou seja, quando for indispensável à proteção dos bens dos quais mais importantes e vitais ao convívio na sociedade. Três aspectos principais embasam esta teoria que é o princípio da intervenção mínima, o princípio  da individualização da pena e o método da ressocialização.

Temos o princípio da intervenção mínima que é de análise obrigatória, sendo o verdadeiro coração do Direito Penal do Equilíbrio, tendo sua vertente girando em torno da teoria do bem jurídico, outra vertente é que o Direito Penal seja aplicado de forma subsidiária, tendo em vista a drasticidade da sua resposta, somente sendo necessária a interferência do ramo Penal quando os outros ramos demonstrarem que são ineficazes ou insuficientes à sua proteção. Uma coisa que deve ser observada é o costume de cada sociedade, de acordo com a sua cultura, as que divergirem é chamado de zonas de conflito entre bens jurídicos, coisas normais de acontecer. Como exemplo temos o delito de aborto, punido pela legislação brasileira e tolerado em outras Nações. O primeiro passo para se analisar algum delito é selecionar os bens jurídicos, atingidos, para de acordo com o art 59 CP, aplicar-se a pena-base, após isso é verificado qual o bem jurídico que merece realmente a atenção do Direito Penal. Os que vão merecer esta atenção do Direito Penal são os mais graves e radical de todos. Na tarefa de proteção dos bens vitais e necessários ao convívio em sociedade, o legislador, encarregado da seleção destes bens, deve considerar como princípios norteadores da sua atividade a chamada intervenção mínima do Direito Penal. Como observação destes bens, temos que a sociedade é mutante, com isso, um bem que hoje não é protegido pela constituição, com a evolução humana, pode ser amanha, não fica sendo absoluto. A grande máxima deste princípio é a segunda vertente dele, já comentada acima, que deve ser analisada como ultima ratio.

Quanto ao princípio da individualização da pena, ele está disposto no Art 5º, XLVI da CF. Este princípio ocorre em três fases distintas: fase da cominação, fase da aplicação e fase da execução. Em um primeiro plano, o legislador, mesmo com dificuldades, procura dar a importância que cada bem merece, valendo-se do instrumento da individualização das penas relativas a cada infração penal. Num segundo momento, uma vez praticada a infração penal, o juiz deverá individualizar, por mais uma vez, a pena, para fins de sua efetiva aplicação ao agente. Para que o juiz possa, com precisão, individualizar a pena do agente que praticou a infração penal, deverá observar o critério trifásico determinado pelo caput do Art 68 do CP. De acordo com Paganella Boschi: “ A individualização da pena na fase de execução é, no Brasil, ainda uma garantia vaga, indefinida, etérea, que permite afirmar que a reclusão e a detenção não ressocializam, porque não há ressocialização sem tratamento e sem que o condenado esteja determinado a se ressocializar".

A idéia principal do sistema prisional é a ressocialização. Teorias criadas vêm a dar embasamento sobre isso, temos a teoria absoluta, com os olhos voltados para o passado, ou seja, simplesmente para a infração penal praticada pelo agente, advogam a tese da retribuição, sendo que as teorias relativas, com os olhos voltados para o futuro, buscando evitar que outras infrações penais sejam cometidas, apregoam a prevenção.  Alguns casos demonstram que a sociedade não está preparada para receber o egresso do preso. Quando surgem os movimentos de reinserção social, quando algumas pessoas se mobilizam no sentido de conseguir emprego para os egressos, a sociedade trabalhadora se rebela, sob o diversos argumentos, dizendo que se eles que são de “bem”, não conseguem emprego que dirá uma pessoa que estava condenada. O grande X da questão é como o Estado vai levar a efeito o programa de ressocialização do condenado se não cumpre as funções sociais que lhes são atribuídas na Constituição Federal? De acordo com Rogério Greco “ a idéia minimalista aliviaria o problema da ressocialização”. Sobre o preso no convívio da cadeia preleciona Gervan de Carvalho: “ Ingressando na prisão, o condenado se ‘socializa’, isto é, aprende a viver em uma nova sociedade que tem leis próprias, classes, e uma rígida hierarquia que ele se vê na contingência de respeitar até por uma questão de sobrevivência. É o chamado fenômeno da ‘prisionalização’, que atinge inclusive os funcionários do sistema penitenciário que convivem com os presos”.

Portanto, diante desta teoria do Direito Penal do Equiílibrio, o Direito Penal só deve ser analisado em último caso, se que entrar para ser objeto de estudo e aplicação, deve ser observado o princípio da individualização da pena, que não poderá passar da pessoa do condenado e este condenado princisa da ressocialização para voltar a viver no seio social.

Álvaro Jr. e Fellipe Matheus. Estudantes de Direito da Universidade Potiguar - UnP

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Direito de resistência, Abuso de poder, ignorância sobre direitos constitucionais.


O Código Civil (artigo 6º) fixa um princípio geral de Direito: “a ignorância ou má interpretação da Lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas”.

A recente ferocidade inspectiva (ASAE, DGV, Finanças, etc) tem levado à instalação de um Estado de terror sobre as pessoas, tendo tais entidades (“Autoridades” como gostam de ser chamadas) procurado abrigo naquele princípio jurídico, fazendo dele uso abusivo e inaceitável.

E se os cidadãos exigissem ferozmente igual cumprimento da Lei aos agentes inspectivos, vulgo, autoridades?

Os governantes têm afirmado que os cidadãos estão “confiantes”. Inqualificável: confundem confiança com medo. Maquiavel fazia – com a diferença de ser inteligente – o mesmo…

Quero aqui lembrar, para exigir na medida em que se recebe, duas ferramentas jurídicas: o direito (constitucional) de resistência e o crime de abuso de poder.

O primeiro resulta do art.º 21 da Constituição: “todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias, e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública”. Curioso é quando a ordem provem precisamente de autoridade pública, o que não anula – antes reforça – o direito de resistência.

Os direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente previstos, são imediatamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas (art.º 18º CRP).

Não raras vezes os agentes de entidades públicas actuam com manifesto abuso. Não há desculpas: a Lei, como o Sol, é para todos (convém também lembrar o art.º 22 CRP: Responsabilidade do Estado e Entidades Públicas).

Dispõe, por outro lado, o Art.º 382 (Abuso de poder) do Código Penal “O funcionário que, fora dos casos previstos nos artigos anteriores, abusar de poderes ou violar deveres inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal”.

Ora, a intenção de causar prejuízo é pouco discutível… a questão do “abuso de poderes” ou “violação de deveres inerentes às suas funções” parece ser também comum.

Então: por que não resistir e, sendo caso, apresentar SEMPRE queixa-crime contra estes agentes de “autoridade” quando abusam da mesma?

Pedro Hilário - Advogado
Fonte: http://www.regiao-sul.pt/noticia.php?refnoticia=80701

Justiça Penal Democrática e os Direitos Humanos


“Que o perdão seja sagrado
Que a fé seja infinita
Que o homem seja livre
Que a justiça sobreviva”. (Ivan Lins e Vitor Martins)

Quando se fala de Direitos Humanos e de Direito Penal relacionam-se todas as questões com a administração da justiça criminal; portanto existe uma grande intimidade entre os Direitos Humanos com os ramos das ciências penais e criminológicas, vale dizer: do direito penal, processual penal e do direito penitenciário, propriamente dito.

O direito penal como lei infraconstitucional deve ser sempre estudado e aplicado à luz do princípio da hieraquia vertical de validade e soberania das normas. Neste contexto não podemos olvidar os Direitos Humanos dos processados e/ou dos condenados pela justiça penal, expressas em diversos instrumentos internacionais aderidos pelo governo, dentro de seu processo legislativo próprio (art. 59 e segts. da Constituição Federal), bem como segundo a aceitação tácita universal.

Ressalte-se, a lei penal de natureza material ou substantiva (Código Penal) somente obtêm crédito e legitimidade se amparada pelo princípio da representação popular, vez que compete privativamente a União legislar sobre direito penal, conforme estabelece o artigo 22, inc.i, da Carta Magna.

Assim, o princípio da taxatividade está ligado com o princípio da representação popular, e a sua vez ao princípio da indelegabilidade de função, pois não se admite no sistema democrático de Direito Penal os denominados tipos abertos e muito menos os tipos penais em branco.

A República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito, tendo como um dos seus fundamentos a dignidade da pessoa humana (inc. iii art. 1º CF), e rege-se pelo princípio da prevalência dos Direitos Humanos, nas suas relações internacionais, “ex vi” do in. ii, art. 4º da Constituição federal, “mutatis mutandis”, também e em especial nas questões internas.

Insisto na expressão: “Estado de Direitos Humanos”, por ser muito mais abrangente do que “Estado de Direito”, seja ele democrático ou social, considerando que a falta de observância das necessidades básicas e reais quanto as garantias fundamentais da cidadania, individuais ou coletivas, acarreta séria violação aos direitos indisponíveis, em outras palavras, configura flagrante atentado aos Direitos Humanos. Um Estado somente é democrático quando as autoridades públicas constituídas (legisladores, polícia, promotores de justiça e juízes) que protagonizam o sistema de administração de justiça devem aplicar o direito penal para resguardar amplamente os princípios gerais de Direitos Humanos dos processados e do condenados.

Os princípios intra e extra-sistemáticos segundo o prof. Alessandro Baratta, servem como basilares para a administração da justiça e são requisitos mínimos de respeito aos Direitos Humanos ante a lei penal.

Com a correta aplicação da “Teoria Geral do Ordenamento Jurídico” o Direito Penal como ramo das ciências jurídicas esta dentro do contexto do princípio da “ultima ratio” e/ou a sanção privativa de liberdade, como alternativa de último recurso para a solução dos conflitos sociais.

A descriminalização ou a despenalização de direito é necessária para a reforma global de todo o ordenamento jurídico, não somente a respeito da legislação penal, pois a conduta hoje considerada crime com previsão de sanção penal, no futuro poderia passar a ser ilícito civil com a cominação da pena correspondente, ex. administrativa, comercial, trabalhista ou tributária.

Ao Estado incumbe assegurar a devida proteção dos direitos indisponíveis, ou seja, dos Direitos Humanos da sociedade "extra" ou "intra-murus", através da garantia - do “ius libertatis” - do direito de ir e vir.

Expressa a "lex fundamentalis". Todas as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais possuem aplicação imediata e não excluem outras decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, via direito público interno e internacional (parágrafo 1º e 2º do art. 5º CF). A lei - ordinária - punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e garantias fundamentais ( inc. XLI art. 5º CF) ; todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza (art. 5º "caput" CF), entre cidadãos presos ou em liberdade provisória, de acordo com o direito positivo .

Qualquer atentado aos Direitos Humanos configura crime e deve ser punido dentro das regras do “ius persequendi” o que autoriza e legitima o “ius puniendi” estatal.

Nos regimes democráticos a interpretação da norma criminal somente é admitida quando beneficia o réu, sempre retroagindo a seu favor (inc. xl art. 5º CF), onde a analogia permitida é a "in bonan partem", nunca a “in malan partem”.

A título de comparação, o Dec. lei nº 3.689/41, estabelece que em todo território brasileiro ressalva-se no processo penal os Tratados e as Convenções de direito público internacional (art. 1, inc. I). Já decidiu o Pretório Excelso, na hipótese de conflito entre lei (ordinária, leia-se Direito Penal) e Tratado prevalece o Tratado (documentos internacionais de Direitos Humanos (STF, HC 58.272, DJU 3.4.81, p. 2854; HC 58.731, DJU 3.4.81 p. 2854).

Na ótica desta interpretação, pode-se, perfeitamente incluir o Direito Penal material, pois a aplicação das penas de prisão simples, detenção ou de reclusão vinculam-se com o próprio código processual penal na medida do que estabelecem as regras de execução, nas hipóteses do livramento condicional, do limite para o cumprimento da pena privativa de liberdade, dentre outras situações.

A Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados ( ONU -1969) expressa nos artigos 26 e 27, que: “Todo Tratado obriga as Partes e deve ser executado por elas de boa-fé (“pacta sunt servanda”); e “uma Parte não pode invocar as disposições de seu direito interno como justificativa para o inadimplemento de um Tratato”; inclua-se, dentro de um conceito “lato sensu”, também outros instrumentos legais de Direitos Humanos, como: Pactos, Convenções, Declarações, etc.

Ademais, a Convenção Americana (OEA) sobre Direitos Humanos, ou o chamado Pacto de San José da Costa Rica (1969), aderido pelo governo brasileiro, em 1992, determina que nenhum dispositivo da presente Convenção poderá ser interpretado no sentido de permitir a supressão, excluir ou limitar exercício de direitos e da liberdade.

Também o Conjunto de Princípios para a proteção de todas as pessoas submetidas a qualquer forma de detenção ou prisão (das Nações Unidas), no princípio 3º reza que: “Não se restringirá ou menosprezará nenhum dos direitos humanos das pessoas submetidas a qualquer forma de detenção ou prisão reconhecidos ou vigentes em um Estado em virtude de leis, convenções, regulamentos ou costumes sob pretexto de que o presente Conjunto de Princípios não reconhece esses direitos ou os reconhece em menor grau”.

A própria “lex fundamentalis” no parágrafo 2º do artigo 5º dos direitos e garantias fundamentais, dispõe que; “ os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

O instrumento das Nações Unidas "Princípios Básicos para o Tratamento dos Reclusos (Resolução nº 45/111, de 14.12.1990) adotado e proclamado pela Assembléia Geral, expressa que todos os princípios serão aplicados de forma imparcial (Princípio nº 11), isto é, sem discriminação de qualquer natureza. Trata-se de imposição taxativa e não normativa subjetiva, do verbo deverá, que deixa a critério das autoridades encarregadas de custodiar e assistir os presos ou de cumprir e aplicar a lei penitenciária, ao livre arbítrio ou à discrecionariedade ilimitada.

A Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena, através de sua Declaração e Programação, de 25 de junho de 1993, saúda o progresso alcançado na codificação dos instrumentos de direitos humanos, constitui um processo dinâmico e evolutivo e apela para a ratificação universal dos tratados de Direitos Humanos. Pede-se encarecidamente a todos os Estados que manifestem adesão a esses instrumentos internacionais; exorta-se a todos os Estados que, dentro do possível, se abstenham de formular reservas (doc. original).

Além dos Tratados e Convenções de Direitos Humanos é muito importante que se leve em conta a legislação positiva das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos, a respeito de normas de aceitação universal consagradas sob o processo de adesão tácita ou votação expressa dos representantes dos Estados-Membros que compõem as Assembléias-Gerais da ONU e da OEA.

Os Direitos Humanos possuem proteção a nível internacional e regional. A nível internacional, a proteção inicia com a criação do Pacto da Sociedade das Nações no ano de 1920, posteriormente, em 26 de junho de 1945, assina-se a Carta da Organização das Nações Unidas (ONU), que tem por propósito a realização da cooperação internacional para o desenvolvimento e estímulo de respeito aos Direitos Humanos e às liberdades fundamentais de todos, sem nenhuma distinção; em seguida surge a Declaração Universal dos Direitos Humanos (em 10.12.1948), aceita e proclamada pelos Estados-Membros. Regionalmente, no continente americano a tutela dos Direitos Humanos começa formalmente com a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada pela Nona (9ª) Conferência Internacional Americana em Bogotá, Colômbia, no ano de 1948, na qual se criou a Organização dos Estados Americanos (OEA), com o fim de propugnar pela ordem, pela paz e pela justiça, onde na sua Carta constam os "Direitos Fundamentais da Pessoa Humana”, como um dos princípios que fundamentam a Organização.

Expressa o Direito Penal (art. 7.º Lei 7.209/84): “ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometido no estrangeiro, os crime que por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir”; por exemplo: genocídio, tráfico de drogas, tortura, etc.

O Direito Penal de Autor coaduna-se com um regime autoritário-ditatorial de governo, por outro lado o Direito Penal de Ato vincula-se ao Estado Democrático e aos Direitos Humanos; o primeiro se refere às questões da pessoa, propriamente dita, condição financeira, "status social", influências políticas, etc., já o segundo, possui estreita e exclusiva relação com o ato ilícito, em si.

Não se pode, em nenhum caso levar em consideração a nacionalidade do agente, vez que não se julga a nacionalidade (Direito Penal de Autor) mas o fato (Direito Penal de Ato), do contrário o magistrado estará ferindo violentamente diversos documentos internacionais de proteção às pessoas estrangeiras, no momento em que efetiva discriminação de raça, nacionalidade, etc. Dispõe o artigo 5.º “caput” da Carta Magna, brasileiros e estrangeiros são iguais perante a lei e estão sujeitos ao mesmo tratamento ante os Tribunais, daí porque se pune qualquer espécie de discriminação e de preconceito (Lei n.º 9.459/97), em observância a Declaração e a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial (Proclamada e Adotada pela Assembléia Geral/ONU Res. 1904 [XVIII], de 20.11.63, e 2106 A [XX] de 21.12.65, respectivamente). Ratificação em 27.3.1968.

Se faz mister, ainda, mencionar o princípio do “tempus regit actum”, combinado com “lex posteriori derrogat anteriori”, “lex especiali derrogat generale”, e “lex mitior” prevalece sobre a “lex gravior”, no tempo e espaço à luz da soberania das normas penais, em base a uma política criminal e penitenciária verdadeiramente democrática e moderna.

Para a análise da culpabilidade (art. 59 do CP) deve o juiz levar em consideração o princípio do ônus da prova, do encargo “probandi”, sendo que somente é legitima a condenação, no Estado de Direito Penal democrático, em base a provas concretas e absolutas da culpabilidade do agente, do contrário prevalece o princípio “in dubio pro reo”, porque na sistemática atual não existe a aceitação da probabilidade, o direito penal democrático não aceita e não trabalha com suposições ou congecturas, razão pela qual a presunção de dolo é abominável, e ainda impera na nossa legislação.

Ainda quando se comenta sobre a aplicação da pena à luz dos Direitos Humanos, deve-se fazer uma importante ressalva quanto ao instituto da reincidência, pois se choca com o princípio “non bis in idem”, na medida em que cria um plus modificando a sentença condenatória transitada em julgado. Seja a reincidência de direito ou de fato, ambas são incompatível com os princípios reitores de Direitos Humanos.

Nos Estados Democráticos de Direito da República Federativa do Brasil (Constituição de 1988), o instituto da reincidência não deveria existir, em respeito ao princípio "non bins in idem". A criminologia aplicada deveria ser unicamente a sócio-política, porque a criminologia clínica (positivista, lombrosiana, ferriana e da Doutrina da Defesa Social, para citar algumas) se enquadra ao Direito Penal de Autor.

De outro lado, as denominadas Medidas de Segurança, ferem o princípio da saturação do cumprimento da pena privativa de liberdade (art. 75 CP), ainda que se tenha tentado conceituá-la como medida curativa, na prática trata-se de verdadeira sanção restritiva do direito de ir e vir, imperando forte influência da Escola Positivista, mais especificamente da Escola da Defesa Social, onde perdura no direito penal atual o chamado exame criminológico (art. 97 e parágrafos do CP e art. 171/174 da Lei n.º 7.210/84).

De outro lado, também, à luz dos princípios gerais de Direitos Humanos poder-se-ia dizer que na prática não se respeitam os Códigos de ética médica-psiquiátrica, na medida em que a Declaração dos Direitos do Retardado Mental (Proclamada pela Assembléia Geral/ONU Res. 2856 [XXVI], de 20.12.71), e os Princípios para a proteção dos Enfermos Mentais e o melhoramento da atenção à saúde mental (Adotados pela Assembléia Geral/ONU Res. 46/119, de 17.12.91), necessitam de maior integração prática com as nomas de Declaração dos Direitos do Retardado Mental (Proclamada pela Assembléia Geral/ONU Res. 2856 [XXVI], de 20.12.71), e de Direito Penal, se levarmos em consideração que a questão da inimputabilidade por doença mental possui estrita relação com a área da saúde e não com as ciências jurídicas.

Somente com o devido respeito a todos os princípios de direito penal material e adjetivo se poderá falar em “devido processo legal”, obviamente estamos mencionando a proibição taxativa da produção de provas ilícitas, verbi gratia, a tortura como forma de fazer confessar o implicado, não produz efeito “probandi” e ademais caracteriza delito inafiançável e insuscetível de clemência presidencial (inc. xliii do art. 5.º CF).

Para a prevenção da prática de tortura se faz necessário o respeito e a difusão dos Documentos internacionais de Direitos Humanos, entre eles a Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e Outros Tratos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (adotada pela Assembléia Geral /ONU Res. 3452 [XXX] de 9.12.1975, a Convenção contra a Tortura e outros Tratos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes ( adotada pela Assembléia Geral/ONU Res. 39/46, de 10.12.1984 - vigência 26.6.87), ratificação em 28.9.1989, Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura OEA (1985), ratificação em 20.7.1989, Decreto de promulgação nº 98386, de 9.11.89, e os Princípios de ética médica aplicável à função do pessoal de saúde, especialmente os médicos, na proteção de pessoas presas e detidas contra a tortura e outros tratos ou penas cruéis, desumanas ou degradantes (adotado pela Assembléia Geral/ONU Res. 37/194, de 18.12.1982), em especial a aplicação da lei n.º 9.455/97; bem como do Código de Conduta para Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei (ONU/Res. 34/169, 17.12.79) e dos Princípios Básicos sobre o Emprego da Força e de Armas de Fogo por Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei (ONU /adotado no 8º Cong. Hawana-Cuba 27.8 à 7.9.90).

Justiça Penal se faz tanto com a condenação como com a absolvição em nome do princípio da imparcialidade.

Indubitavelmente, devemos propugnar pela proclamação do Direito Penal do Perdão, na expressão de Antonio Beristain. Não se trata de impunidade, mas de princípios de justiça penal eficiente e humanitária, onde se dá mais atenção à vítima, prevalecem as circunstâncias atenuantes sobre as agravantes, amplia-se para o magistrado o instituto do perdão judicial, buscam-se novas terminologias jurídico-penal, em câmbio daquelas que produzem efeitos negativos (estigmatizantes) ao réu, e se efetivam medidas substitutivas ou penas alternativas a de prisão.

O juiz pode dispensar a pena ou aplicar abaixo do mínimo legal, sempre que a reprimenda ao “delinquente” tenha alcançado a reparação do dano ou ainda quando o próprio ato cause, também, ao agente um grave dano ou sofrimento, assim ensina o prof. Raúl Zaffaroni, quando comenta sobre o princípio da humanidade, afirmando que é juridicamente perfeito, posto que pode ser supra legal, mas intra-constitucional.

Quando a conduta humana não apresenta maior relevo de reprovação, por si só pode-se excluir a tipicidade formal. “...o dano é tão párvulo que o tipo não se integra, impondo-se o desacolhimento da ação penal” (TACrim-SP - AC 481.889-1 - Rel. Gonçalves Nogueira); por sua vez “...o direito penal, por sua natureza fragamentária, só vai onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatela...” (Mins. Francisco Assis Toledo, in Princípios Básicos de Direito Penal, ed. Saraiva, SP, 1982, pg. 187/188);

Assim, com a necessária mudança da práxis forense-criminal, ante a sua moderna função teremos uma Justiça recriativa, democrática, popular e participativa, em troca da Justiça retributiva.

__________________
Prof. Dr. Cândido Furtado Maia Neto - Professor Pesquisador e de Pós-Graduação (Especialização e Mestrado). Associado ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI). Pós Doutor em Direito. Mestre em Ciências Penais e Criminológicas. Expert em Direitos Humanos (Consultor Internacional das Nações Unidas – Missão MINUGUA 1995-96). Promotor de Justiça de Foz do Iguaçu-PR. Membro do Movimento Nacional prol Ministério Público Democrático (MPD). Secretário de Justiça e Segurança Pública do Ministério da Justiça (1989/90). Assessor do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná, na área criminal (1992/93). Membro da Association Internacionale de Droit Pénal (AIDP). Conferencista internacional e autor de várias obras jurídicas publicadas no Brasil e no exterior. E-mail: candidomaia@uol.com.br
(Fonte: http://www.direitoshumanos.pro.br/ler_dhumano.php?id=10)

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O Bode Expiatório


[Em sentido figurado, um "bode expiatório" é alguém que é escolhido arbitrariamente para levar (sozinho) a culpa de uma calamidade, crime ou qualquer evento negativo (que geralmente não tenha cometido). A busca do bode expiatório é um ato irracional de determinar que uma pessoa ou um grupo de pessoas, ou até mesmo algo, seja responsável de um ou mais problemas sem a constatação real dos fatos. - Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Bode_expiat%C3%B3rio]

A expressão “bode expiatório” tem sua origem nos tempos da Antiguidade, nas antigas tribos judaicas. O bode representava um papel simbólico nas cerimônias hebraicas do Yom Kippur, o Dia da Expiação.

O pobre animal era escolhido para concentrar em si todos os pecados do povo de Israel. Um sacerdote colocava as suas mãos na cabeça do coitado do bode e confessava para o infeliz animal todos os pecados da população de Israel. Posteriormente, o bode era solto na natureza selvagem a fim de que pagasse por todos os pecados cometidos pela gente de Israel. Por isso que se chama “bode expiatório” - expiação significa penitência, ou seja, castigo ou sofrimento de pena para se obter a remissão dos pecados.

Nos dias de hoje essa expressão ainda é utilizada em um sentido figurado. Sempre que se escolhe alguém como culpado por qualquer coisa negativa, mesmo que esse alguém não seja o culpado (ou o único culpado), estamos a fazer o mesmo que o povo das antigas tribos judaicas, quer dizer, escolhemos um “bode” a fim de que ele, sozinho e largado na “natureza selvagem”, pague por nossos erros ou nossas falhas (pecados).

A busca pelo “bode expiatório” é um mecanismo de defesa; um recurso para se apontar um responsável pelo(s) problema(s) e não assumir nossas próprias responsabilidades.

Para a Psicanálise o “bode expiatório” faz parte de um dos mecanismos de defesa da personalidade, a saber, a racionalização. Os mecanismos de defesa atuam de forma a que nós, seres humanos, não enfrentemos de frente todas as nossas frustrações e fracassos.

A racionalização seria um desses mecanismos de defesa e a eleição de um “bode expiatório” se encontra dentro de um dos recursos da racionalização. Jogar a culpa em alguém ou alguma coisa ao invés de assumirmos nossas responsabilidades não passa de um artifício para aliviarmos o nosso próprio sentimento de culpa e nos sentirmos melhores com nós mesmos e com os outros.

Dentre os mecanismos de defesa da personalidade podemos encontrar a projeção, que é “atribuir a outros as idéias e tendências que o sujeito não pode admitir como suas”, ou seja, jogar para cima de outra pessoa os nossos próprios defeitos.

Ao meu ver a ideia de “bode expiatório” tanto pode ser encontrada na racionalização como na projeção.

Dentro da Criminologia existe uma teoria que relaciona a ideia do “bode expiatório” com a necessidade da sociedade em ver o deliquente ser punido de forma exemplar.

Criminologia é uma ciência empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle do comportamento delitivo. E como ciência interdisciplinar e pluridimensional que é, a Criminologia mantém uma relação de interesses de estudo com a Psicanálise, são as chamadas Teorias Psicanalíticas da Criminalidade.

Dentre estas teorias podemos encontrar uma que é bastante interessante e que me levou a refletir um pouco e, obviamente, a escrever esse texto. Trata-se das Teorias Psicanalíticas da Sociedade e a Interpretação Funcional da Reação Punitiva.

Para esta teoria, o Direito Penal não busca, objetivamente, a justiça ou a prevenção do crime. Na realidade, a pena tem uma função de satisfazer uma necessidade da “sociedade sancionadora” que “necessita” do castigo.

A sociedade não busca na pena a justiça ou a prevenção dos crimes; na realidade a sociedade tem uma necessidade inconsciente do castigo, de ver o deliquente ser castigado, para que este sirva de exemplo e pague não só pelos seus erros, mas pelos desejos reprimidos de toda a sociedade.

É a ideia do “bode expiatório”. O deliquente, na verdade, é o alvo de todas as frustrações e agressividade da coletividade, que se identifica com ele e projeta sobre o mesmo a necessidade de castigo.

Tal como o pobre do bode, que leva consigo para o deserto todos os pecados do povo de Israel, a pena infligida ao criminoso tem um caráter coletivo e não individual (como é colocado pelo Direito Penal vigente). Na realidade a pena não serve para reeducar o indivíduo a fim de recolocá-lo no convívio social; o castigo imposto ao deliquente é o exemplo visível que a sociedade impõe ao “bode expiatório”, para que sirva de controle aos impulsos criminosos de todas as pessoas, uma vez que a própria sociedade se identifica com o criminoso.

Na prática do Direito Penal dogmático essa teoria esbarra, dentre outras coisas, com a Culpabilidade, que é um dos elementos constitutivos do crime.

Na Teoria do Crime, a Culpabilidade é o único dos três elementos (que integra e forma o crime) que versa sobre a pessoa humana. A culpabilidade é um juízo de reprovação pessoal – o desvalor da culpabilidade reprova o autor de um fato típico e antijurídico, por não haver se comportado conforme o direito ou não tendo se decidido pelo direito, quando podia se comportar conforme o direito ou podia ter decidido pelo direito.

Em resumo: a culpabilidade é um juízo negativo, de reprovação pessoal, ao autor do fato que poderia ter agido de acordo com as normas, mas, de forma consciente e livre, agiu contra as normas.

Isso bate de frente com a ideia de que a sociedade se projeta no criminoso, identificando-se com ele e que a pena é um mecanismo de repressão dos impulsos criminosos de todos os membros da coletividade.

Apesar disso, embora não vejamos aplicação prática dessa teoria psicanalítica no Direito Penal, não posso deixar de observar que, em termos de sociedade e comportamento humano, a teoria do “bode expiatório” é bastante interessante e, indubitavelmente, facilmente verificável através do convívio social.

Quem nunca conheceu ou conviveu com alguém que se recusa a assumir os seus próprios defeitos ou reconhecer as suas falhas?

Quem não conhece alguém que é excelente a apontar os erros e defeitos dos outros, mas é incapaz de se olhar no espelho e fazer uma autocrítica?

Quem não conhece pelo menos uma pessoa que coloca a culpa de tudo nos outros, que aponta o dedo com uma veemência voraz, mas que, quando confrontada com suas deficiências, reage de forma agressiva e não aceita uma análise negativa a respeito de seus atos?

Quem não conhece alguém que adora julgar e condenar as atitudes alheias?

Certa vez, uma amiga me disse – “Emanuel, essa pessoa que tanto critica os outros, que acusa e aponta o dedo às atitudes de todos, na verdade tem uma vontade tremenda de fazer tudo isso que ela critica, mas não tem coragem”.

Lá está. Essa minha amiga descreveu com perfeição a teoria do “bode expiatório” - apontar para os outros a culpa ou jogar para os outros os defeitos que não suporta admitir como seus.

Pois é, aí entra o “bode expiatório”... Apontamos para os outros a culpa dos nossos próprios desejos reprimidos que, quando refletidos nos outros, nos incomoda de uma forma que é necessário que o OUTRO pague pelos meus pecados/erros, a fim de que eu me sinta aliviado e possa conviver comigo mesmo de forma tranquila e serena.

Somos todos humanos e todos nós somos passíveis a erros e defeitos. Todos nós agimos inconscientemente em defesa de nossa personalidade. Por isso que devemos estar sempre atentos às nossas ações e devemos procurar nunca julgar os outros sem antes fazermos uma autocrítica e termos personalidade forte o suficiente para assumirmos nossos erros e defeitos, sem ter que recorrer a “bodes expiatórios” para fugir da realidade.

Fonte: http://emanuel-junior.blogspot.com.br/2009/08/o-bode-expiatorio-e-fuga-da-realidade.html

Assédio Moral

O que é assédio moral?

Assédio moral ou violência moral no trabalho não é um fenômeno novo. Pode-se dizer que ele é tão antigo quanto o trabalho. A novidade reside na intensificação, gravidade, amplitude e banalização do fenômeno e na abordagem que tenta estabelecer o nexo-causal com a organização do trabalho e tratá-lo como não inerente ao trabalho. A reflexão e o debate sobre o tema são recentes no Brasil, tendo ganhado força após a divulgação da pesquisa brasileira realizada por Dra. Margarida Barreto. Tema da sua dissertação de Mestrado em Psicologia Social, foi defendida em 22 de maio de 2000 na PUC/ SP, sob o título "Uma jornada de humilhações".


O que é humilhação?

Conceito: É um sentimento de ser ofendido/a, menosprezado/a, rebaixado/a, inferiorizado/a, submetido/a, vexado/a, constrangido/a e ultrajado/a pelo outro/a. É sentir-se um ninguém, sem valor, inútil. Magoado/a, revoltado/a, perturbado/a, mortificado/a, traído/a, envergonhado/a, indignado/a e com raiva. A humilhação causa dor, tristeza e sofrimento.


E o que é assédio moral no trabalho?

É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras,repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego. Caracteriza-se pela degradação deliberada das condições de trabalho em que prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação a seus subordinados, constituindo uma experiência subjetiva que acarreta prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador e a organização. A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos pares. Estes, por medo do desemprego e a vergonha de serem também humilhados associado ao estímulo constante à competitividade, rompem os laços afetivos com a vítima e, freqüentemente, reproduzem e reatualizam ações e atos do agressor no ambiente de trabalho, instaurando o ’pacto da tolerância e do silêncio’ no coletivo, enquanto a vitima vai gradativamente se desestabilizando e fragilizando, ’perdendo’ sua auto-estima. Entretanto, quer seja um ato ou a repetição deste ato, devemos combater firmemente por constituir uma violência psicológica, causando danos à saúde física e mental, não somente daquele que é excluído, mas de todo o coletivo que testemunha esses atos. A humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador e trabalhadora de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental*, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte, constituindo um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho. A violência moral no trabalho constitui um fenômeno internacional segundo levantamento recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT) com diversos paises desenvolvidos.


Fases da humilhação no trabalho

A humilhação no trabalho envolve os fenômenos vertical e horizontal.

O fenômeno vertical se caracteriza por relações autoritárias, desumanas e aéticas, onde predomina os desmandos, a manipulação do medo, a competitividade, os programas de qualidade total associado a produtividade. Com a reestruturação e reorganização do trabalho, novas características foram incorporadas à função: qualificação, polifuncionalidade, visão sistêmica do processo produtivo, rotação das tarefas, autonomia e ’flexibilização’. Exige-se dos trabalhadores/as maior escolaridade, competência, eficiência, espírito competitivo, criatividade, qualificação, responsabilidade pela manutenção do seu próprio emprego (empregabilidade) visando produzir mais a baixo custo. A ’flexibilização’ inclui a agilidade das empresas diante do mercado, agora globalizado, sem perder os conteúdos tradicionais e as regras das relações industriais. Se para os empresários competir significa ’dobrar-se elegantemente’ ante as flutuações do mercado, com os trabalhadores não acontece o mesmo, pois são obrigados a adaptar-se e aceitar as constantes mudanças e novas exigências das políticas competitivas dos empregadores no mercado global.

O fenômeno horizontal está relacionado à pressão para produzir com qualidade e baixo custo. O medo de perder o emprego e não voltar ao mercado formal favorece a submissão e fortalecimento da tirania. O enraizamento e disseminação do medo no ambiente de trabalho, reforça atos individualistas, tolerância aos desmandos e práticas autoritárias no interior das empresas que sustentam a ’cultura do contentamento geral’. Enquanto os adoecidos ocultam a doença e trabalham com dores e sofrimentos, os sadios que não apresentam dificuldades produtivas, mas que ’carregam’ a incerteza de vir a tê-las, mimetizam o discurso das chefias e passam a discriminar os ’improdutivos’, humilhando-os. A competição sistemática entre os trabalhadores incentivada pela empresa, provoca comportamentos agressivos e de indiferença ao sofrimento do outro.


Os espaços da humilhação

A empresa
Começar sempre reunião amedrontando quanto ao desemprego ou ameaçar constantemente com a demissão.
Subir em mesa e chamar a todos de incompetentes.
Repetir a mesma ordem para realizar uma tarefa simples centenas de vezes até desestabilizar emocionalmente o trabalhador ou dar ordens confusas e contraditórias.
Sobrecarregar de trabalho ou impedir a continuidade do trabalho, negando informações.
Desmoralizar publicamente, afirmando que tudo está errado ou elogiar, mas afirmar que seu trabalho é desnecessário à empresa ou instituição.
Rir a distância e em pequeno grupo; conversar baixinho, suspirar e executar gestos direcionado-os ao trabalhador.
Não cumprimentar e impedir os colegas de almoçarem, cumprimentarem ou conversarem com a vítima, mesmo que a conversa esteja relacionada à tarefa. Querer saber o que estavam conversando ou ameaçar quando há colegas próximos conversando.
Ignorar a presença do/a trabalhador/a.
Desviar da função ou retirar material necessário à execução da tarefa, impedindo o trabalho.
Exigir que faça horários fora da jornada. Ser trocado/a de turno, sem ter sido avisado/a.
Mandar executar tarefas acima ou abaixo do conhecimento do trabalhador.
Voltar de férias e ser demitido/a ou ser desligado/a por telefone ou telegrama em férias.
Hostilizar, não promover ou premiar colega mais novo/a e recém-chegado/a à empresa e com menos experiência, como forma de desqualificar o trabalho realizado.
Espalhar entre os colegas que o/a trabalhador/a está com problemas nervoso.
Sugerir que peça demissão, por sua saúde.
Divulgar boatos sobre sua moral.


Política de reafirmação da humilhação nas empresas

a) com todos os trabalhadores

Estimular a competitividade e individualismo, discriminando por sexo: cursos de aperfeiçoamento e promoção realizado preferencialmente para os homens.
Discriminação de salários segundo sexo.
Passar lista na empresa para que os trabalhadores/as se comprometam a não procurar o Sindicato ou mesmo ameaçar os sindicalizados.
Impedir que as grávidas sentem durante a jornada ou que façam consultas de pré-natal fora da empresa.
Fazer reunião com todas as mulheres do setor administrativo e produtivo, exigindo que não engravidem, evitando prejuízos a produção.
Impedir de usar o telefone em casos de urgência ou não comunicar aos trabalhadores/as os telefonemas urgentes de seus familiares.
Impedir de tomar cafezinho ou reduzir horário de refeições para 15 minutos. Refeições realizadas no maquinário ou bancadas.
Desvio de função: mandar limpar banheiro, fazer cafezinho, limpar posto de trabalho, pintar casa de chefe nos finais de semana.
Receber advertência em conseqüência de atestado médico ou por que reclamou direitos.

b) discriminação aos adoecidos e acidentados que retornam ao trabalho
Ter outra pessoa no posto de trabalho ou função.
Colocar em local sem nenhuma tarefa e não dar tarefa. Ser colocado/a sentado/a olhando os outros trabalhar, separados por parede de vidro daqueles que trabalham.
Não fornecer ou retirar todos os instrumentos de trabalho.
Isolar os adoecidos em salas denominadas dos ’compatíveis’. Estimular a discriminação entre os sadios e adoecidos, chamando-os pejorativamente de ’podres, fracos, incompetentes, incapazes’.
Diminuir salários quando retornam ao trabalho.
Demitir após a estabilidade legal.
Ser impedido de andar pela empresa.
Telefonar para a casa do funcionário e comunicar à sua família que ele ou ela não quer trabalhar.
Controlar as idas a médicos, questionar acerca do falado em outro espaço. Impedir que procurem médicos fora da empresa.
Desaparecer com os atestados. Exigir o Código Internacional de Doenças - CID - no atestado como forma de controle.
Colocar guarda controlando entrada e saída e revisando as mulheres.
Não permitir que conversem com antigos colegas dentro da empresa.
Colocar um colega controlando o outro colega, disseminando a vigilância e desconfiança.
Dificultar a entregar de documentos necessários à concretização da perícia médica pelo INSS.
Omitir doenças e acidentes.
Demitir os adoecidos ou acidentados do trabalho.


Estratégias do agressor

Escolher a vítima e isolar do grupo.
Impedir de se expressar e não explicar o porquê.
Fragilizar, ridicularizar, inferiorizar, menosprezar em frente aos pares.
Culpabilizar/responsabilizar publicamente, podendo os comentários de sua incapacidade invadir, inclusive, o espaço familiar.
Desestabilizar emocional e profissionalmente. A vítima gradativamente vai perdendo simultaneamente sua autoconfiança e o interesse pelo trabalho.
Destruir a vítima (desencadeamento ou agravamento de doenças pré-existentes). A destruição da vítima engloba vigilância acentuada e constante. A vítima se isola da família e amigos, passando muitas vezes a usar drogas, principalmente o álcool.
Livrar-se da vítima que são forçados/as a pedir demissão ou são demitidos/as, freqüentemente, por insubordinação.
Impor ao coletivo sua autoridade para aumentar a produtividade.


A explicitação do assédio moral:

Gestos, condutas abusivas e constrangedoras, humilhar repetidamente, inferiorizar, amedrontar, menosprezar ou desprezar, ironizar, difamar, ridicularizar, risinhos, suspiros, piadas jocosas relacionadas ao sexo, ser indiferente à presença do/a outro/a, estigmatizar os/as adoecidos/as pelo e para o trabalho, colocá-los/as em situações vexatórias, falar baixinho acerca da pessoa, olhar e não ver ou ignorar sua presença, rir daquele/a que apresenta dificuldades, não cumprimentar, sugerir que peçam demissão, dar tarefas sem sentido ou que jamais serão utilizadas ou mesmo irão para o lixo, dar tarefas através de terceiros ou colocar em sua mesa sem avisar, controlar o tempo de idas ao banheiro, tornar público algo íntimo do/a subordinado/a, não explicar a causa da perseguição, difamar, ridicularizar.


O que a vítima deve fazer?

Resistir: anotar com detalhes toda as humilhações sofridas (dia, mês, ano, hora, local ou setor, nome do agressor, colegas que testemunharam, conteúdo da conversa e o que mais você achar necessário).
Dar visibilidade, procurando a ajuda dos colegas, principalmente daqueles que testemunharam o fato ou que já sofreram humilhações do agressor.
Organizar. O apoio é fundamental dentro e fora da empresa.
Evitar conversar com o agressor, sem testemunhas. Ir sempre com colega de trabalho ou representante sindical.
Exigir por escrito, explicações do ato agressor e permanecer com cópia da carta enviada ao D.P. ou R.H e da eventual resposta do agressor. Se possível mandar sua carta registrada, por correio, guardando o recibo.
Procurar seu sindicato e relatar o acontecido para diretores e outras instancias como: médicos ou advogados do sindicato assim como: Ministério Público, Justiça do Trabalho, Comissão de Direitos Humanos e Conselho Regional de Medicina (ver Resolução do Conselho Federal de Medicina n.1488/98 sobre saúde do trabalhador).
Recorrer ao Centro de Referencia em Saúde dos Trabalhadores e contar a humilhação sofrida ao médico, assistente social ou psicólogo.
Buscar apoio junto a familiares, amigos e colegas, pois o afeto e a solidariedade são fundamentais para recuperação da auto-estima, dignidade, identidade e cidadania.


Importante:

Se você é testemunha de cena(s) de humilhação no trabalho supere seu medo, seja solidário com seu colega. Você poderá ser "a próxima vítima" e nesta hora o apoio dos seus colegas também será precioso. Não esqueça que o medo reforça o poder do agressor!

Lembre-se:

O assédio moral no trabalho não é um fato isolado, como vimos ele se baseia na repetição ao longo do tempo de práticas vexatórias e constrangedoras, explicitando a degradação deliberada das condições de trabalho num contexto de desemprego, dessindicalização e aumento da pobreza urbana. A batalha para recuperar a dignidade, a identidade, o respeito no trabalho e a auto-estima, deve passar pela organização de forma coletiva através dos representantes dos trabalhadores do seu sindicato, das CIPAS, das organizações por local de trabalho (OLP), Comissões de Saúde e procura dos Centros de Referencia em Saúde dos Trabalhadores (CRST e CEREST), Comissão de Direitos Humanos e dos Núcleos de Promoção de Igualdade e Oportunidades e de Combate a Discriminação em matéria de Emprego e Profissão que existem nas Delegacias Regionais do Trabalho.

O basta à humilhação depende também da informação, organização e mobilização dos trabalhadores. Um ambiente de trabalho saudável é uma conquista diária possível na medida em que haja "vigilância constante" objetivando condições de trabalho dignas, baseadas no respeito ’ao outro como legítimo outro’, no incentivo a criatividade, na cooperação.

O combate de forma eficaz ao assédio moral no trabalho exige a formação de um coletivo multidisciplinar, envolvendo diferentes atores sociais: sindicatos, advogados, médicos do trabalho e outros profissionais de saúde, sociólogos, antropólogos e grupos de reflexão sobre o assédio moral. Estes são passos iniciais para conquistarmos um ambiente de trabalho saneado de riscos e violências e que seja sinônimo de cidadania.
Fonte: http://www.assediomoral.org